Eu cresci ouvindo histórias.
Algumas contadas pelo meu pai e pela minha mãe, outras ouvidas das bocas
nativas no interior onde cresci e em outros que visitei. E cresci também ouvindo, no mínimo e sempre,
duas versões diferentes de uma mesma história. Meu pai explicava sobre o
folclore e apartava definitivamente qualquer parentesco das lendas com a
realidade. Minha avó (mãe do meu pai) ensinava sobre o poder do canto das
sereias, e afirmava que nenhum pescador estava imune ao feitiço vindo das
águas. Meu pai contava muitas histórias, lia livros quando não sabíamos ler,
comprava muitos livros e brincava com a imaginação. Mas fazia questão de deixar
clara a diferença entre o “conhecimento” e as “crendices”. Minha avó era
crendice pura, e aquilo fascinava. Fui
uma criança excessivamente imaginativa. Mas, em algum ponto da caminhada, a
imaginação abandonou-me. Caminhei por um
bom tempo em linha reta, extenuada pela aridez da “realidade”, esse deserto sem
oásis. Até que, essencialmente, a Arteterapia me salvou de mim mesma. Essa
terapêutica é uma espécie de evocação à criança perdida no caminho, e, quando
nos abrimos, seu resgate subsequente.
Mas os “encontros” ainda se
dariam. A dedicação a estudar Jung e
autores outros que pudessem ampliar minha sensibilidade não foi o suficiente
para amenizar a sensação de que a Psicologia carecia de “poesia”. Porque a
poesia sempre foi uma paixão e um caminho. E eis que um sonho, sonhado
dormindo, me mostrou pegadas poéticas nas areias Psi. James Hillman viera, então, traduzir e dar
amparo ao meu anseio. Junguiano, criador da Psicologia Arquetípica, considerado
um dos expoentes da psicologia pós-junguiana, Hillman denunciou a “ausência de
alma” na psicologia (o que eu chamava de “falta de poesia”) e recuperou o
status da Imaginação, enquanto aspecto importante da Realidade, a sua
contraparte, poderíamos dizer. E um
pouco mais poderia falar aqui da Psicologia Arquetípica – esse é um mundo que
ainda começo a descortinar –, mas deixo aqui o convite para a vivência como
oportunidade de conhecer e experimentar uma abordagem “almada”, como ele
propôs. A ciência não dá conta da Alma.
É preciso estreitar nossas relações com a Poética. A vida que vivemos não
merece uma leitura restrita a dores, transtornos, perdas, traumas, angústias,
clichês que empobrecem qualquer história e impedem um novo olhar. Não que não
tenhamos vivido tudo isso – até podemos e certamente essa é a crença da maioria
–, mas não “exatamente assim”, como nos contaram e como nós próprios
contamos. A proposta da vivência é um
novo olhar sobre a nossa história. O que
foi vivido... foi vivido. Mas a maneira de compreender e os sentidos usurpados
da nossa história através da exclusão da dimensão imaginativa são
“reencontrados” por meio de olhos encantados, por meio da Alma. E, assim,
podemos contar a nossa história de outro ponto de vista, do ponto de vista da
Alma, que esteve tanto tempo ausente e é nossa convidada especial. É também desejo nosso – numa segunda etapa
dessa vivência – organizar um livro com todas as histórias recontadas, num
contexto onde a Arteterapia Junguiana e Pós-junguiana servirá de pano de fundo.
Para que o trabalho continue
sendo uma surpresa, posso apenas adiantar que será um trabalho profundo, onde a
Arte será a linguagem predominante.
Algumas técnicas arteterapêuticas serão utilizadas com o propósito de
acessarmos o mundo imaginário povoado de vidas reais. Teremos a presença de
Afrodite. Beleza e Alma garantidas. O resto será Poesia, devolvendo-nos as
cores originais das nossas imagens. Tudo na Natureza. Fica o convite.
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