Gente que inspira

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31 de ago. de 2013

Bem-vindos ao sonho!



Muito já foi dito sobre a oficina Sonhar com as Mãos. Os textos anteriores buscam traduzir um pouco da sua essência. A partir de segunda-feira, dia 2/9, as inscrições estarão abertas. Gostaria, contudo, de lembrar que essa primeira oficina do Sonhar abre um caminho que trilharemos com a oficina do Sonhar nº 2, onde trabalharemos a Palavra Encantada. Nesse primeiro momento,  vivenciaremos o território da não-palavra. No segundo Sonhar, trabalharemos a palavra com o onirismo de que foi despojada. Agora é sonhar. Buscar estreitar as fronteiras que nos separam da dimensão noturna, onírica, e sonhar acordados, com as mãos, sobretudo. Aos que estiverem dispostos a viver essa aventura, aproximem-se. Um mundo de sonhos espera por vocês.


Dia 5/10/2013
Horário: das 08 às 12
Investimento: R$ 160,00
Para os que se inscreverem até o dia 5 de setembro: R $120,00

As inscrições poderão ser feitas através do e-mail trcontreiras@gmail.com, com o envio do comprovante de depósito.

Caixa Econômica Federal - Ag: 1236 OP 013 Conta-poupança: 110635-8

Vagas limitadas. Reserve sua vaga por e-mail.











30 de ago. de 2013

Ponte para a linguagem dos sonhos (Oficina Sonhar com as Mãos)







 A linguagem abafou a voz. A voz verdadeira, essa que não encontra palavras que lhe sirvam de passagem. Na Arteterapia me pediram pra emitir o meu som, cantar a minha canção e dançar a minha dança. Eu não sabia que existiam dentro de mim. Eu não sabia se conseguiria. Mas eu quis tentar. Um pássaro cantou suavemente pela minha boca. Um canto inédito. Um mundo novo mostrou-se aos poucos. Nós somos apenas o invólucro do Mistério. E ele não se revela através de uma única linguagem, um único padrão. Ele silva, gorjeia, urge, brade... Ele se mostra no falso ilogismo  das linguagens oníricas. Ele transforma a vida num assombro – aquele que nós perdemos ao desenvolvermos sobre os olhos a catarata do desencanto.

Bachelard mais uma vez e sempre: primeiro sonha-se, depois se contemplar. O que contemplamos hoje já o sonhamos antes de algum modo. Mas já não reconhecemos os nossos sonhos quando ele tenta infiltrar-se em nossa vida arrumadinha, embora infeliz. Essa voz que é a voz da noite, desconhecemos. Embora seja ela a nossa voz original. Precisamos debulhar as palavras, descosturá-las, dissolvê-las, até que encontremos o primeiro sinal da nossa voz primal, da nossa voz original, e diminuir a distância entre os mundos diurno e noturno. Até que possamos ficar mais inteiros.

A 1ª oficina Sonhar com as Mãos será o primeiro passo dado em direção à Palavra Encantada – foco de nossa 2ª oficina do Sonhar, dando prosseguimento à primeira. E a proposta foi concebida de modo a trabalharmos o nosso lado direito do cérebro, nossa intuição, criatividade, originalidade. Para isso, é necessário que possamos continuar buscando a nossa própria voz no território da não-palavra. As mãos serão o nosso instrumento de materialização de sonhos. Mas não sonhos padronizados, sonhos condicionados: serão nossos sonhos únicos e reais.

Não, essa não é uma aventura para qualquer um. O Sonhar com as Mãos é um convite àqueles que buscam defrontar-se, sem medo, com o seu verdadeiro eu, multifacetado, mas nem por isso sem harmonia. Não teorizaremos o sonho: viveremos eles!

Não estou fora dessa aventura, muito pelo contrário. Será uma aventura vivenciada por todos nós. Construir os mais profundos, verdadeiros e exilados sonhos. Entregar-se aos sentidos. Compreender que pelas mãos olhamos, escutamos, sentimos, aspiramos, inspiramos, criamos. Já temos a metade das vagas preenchidas, mesmo antes da abertura das inscrições, no próximo dia 1º. E as reservas podem continuar a serem feitas pelo e-mail trcontreiras@gmail.com. Sonhemos com as mãos!

27 de ago. de 2013

Sonhar com as mãos e vivenciar o Mistério







Arte: Evelyn  Patrick


“A vida é um mistério a ser vivido, não um problema a ser resolvido”. Gosto muito dessa afirmação de Gabriel Marcel. Ela me lembra, de algum modo, uma entrevista que fiz, há alguns anos, com um competente e sensível psicoterapeuta corporal, Romero Magalhães, para quem não existem, exatamente, “patologias”, mas tão-somente processos adaptativos da ainda tão nova espécie humana. Estamos aprendendo. Adaptando-nos. Evidentemente isso dói e precisa ser cuidado. Sem, contudo, esquecermos que o “mistério” precisa ser vivenciado.

No decorrer da minha caminhada de auto-descoberta, as analogias foram instrumentos fundamentais, visto que ainda falamos linguagens diversas, aparentemente desconectadas, e as divergências acabam por deixar meio confusos aqueles que buscam compreender-se. A linguagem, a palavra, as denominações tantas vezes são a origem dessa confusão.  Mas com empenho e obstinação, conseguimos, sim, entender que, não raras vezes, estamos falando da mesma coisa.

Nesse caminhar de buscas, adentrei cavernas reais. Senti a escuridão não metafórica, mas literal. Sofri com os alaridos do silêncio e defrontei-me com a serpente sem a pele do símbolo: ela mesma, ali pertinho, nós duas, quando a necessidade de acreditar que era possível falar e ser entendida era fundamental. Viver, literalmente, a escuridão, os fantasmas, os perigos da dimensão noturna foi importante para reconhecer a força, o vigor do imaginário, da linguagem simbólica do inconsciente. Longe de desprezá-lo, a vivência real aguçou a minha percepção e o meu entendimento sobre eles.

Nossas cavernas simbólicas protegem-nos tanto ou mais que as cavernas concretas. Creio que um terapeuta precisa ter sempre isso em mente e ter a habilidade de entrar, junto com aquele de quem cuida, na caverna. Para ajudá-lo a entrar em contato com essa vida interior, o terapeuta, o cuidador, haverá de – como enfatizou Hycner – ajudar a liberar “as centelhas sagradas que ficam aprisionadas em cada um de nós”. Não para que “um problema seja resolvido”, mas para que o mistério da vida possa ser vivido com mais plenitude.

Escrevo essas reflexões pensando não em um ou outro “problema” específico dos que buscam ajuda terapêutica. Estendo meu pensamento à espécie humana. As idiossincrasias precisam ser compreendidas e acolhidas. Despatologizar a vida. Exaltar o mistério. Intensificar o olhar para o cotidiano. Tendo a crer que muito do que chamamos de desequilíbrio, desarmonia, distúrbios etc. não passa de uma impossibilidade de nos enxergarmos como parte do todo da vida. O terapeuta é, também, um reverenciador. Aquele que nos auxilia a recuperar a capacidade plena do olhar. A reverenciar cada momento da vida, devolvendo-lhe as cores.

A vida é, sim, um mistério a ser vivido, não um problema a ser extinto. Reaprender a imaginação, essa dimensão onde recriamos a nossa história. A oficina Sonhar com as Mãos é um convite a essa aventura – vivenciar o mistério, libertar as centelhas sagradas aprisionadas, ouvir a canção que ecoa no solo das palavras virgens. Sonhemos com as mãos!

23 de ago. de 2013

Que seja o sonho a nos entorpecer








Arte: Chiara Fersini









Vi uma bela imagem fotográfica que foi batizada, pela autora, como “A origem dos sonhos”. Fiquei, então, pensando sobre tudo que já lera de sério sobre os sonhos. Nas teorias divergentes. Na atração que o tema exerce sobre todas as pessoas. E imaginei comigo que, sendo as pessoas diferentes, devam existir origens diferentes para os sonhos dos sonhadores. Isso pode ser apenas um delírio poético (sou mais poeta ou mais arteterapeuta?), mas faz sentido.



Eu pensara de onde tinha vindo o meu primeiro sonho, sonhado de olhos abertos. E refletia a respeito do significado que ele poderia ter para nossas vidas. Talvez para o resto de nossas vidas. E fiz de mim própria meu objeto de reflexão.



Eu poderia dizer que o meu primeiro sonho acordado, da minha vida de menina, foi uma ação, tinha movimento: eu girava! Sim, seis anos de idade, sempre procurando ficar sozinha, para poder “girar”. Eu rodopiava tanto, que não saía do pronto-socorro. Cicatrizes de tombos fortes que eu tomava girando.



Por que eu girava? Girava porque adorava ver um mundo feito de borrões coloridos girando com velocidade em torno de mim. Girava porque eu viajava ao meu planeta e sentia felicidade. Rodava porque precisava habitar, nem que por instantes, um mundo mais fluido, uma terra que tivesse a mesma tez que a minha: volátil! Se meus pais tivesse me levado a um psiquiatra, este me diagnosticaria como autista, muito provavelmente.



Pensando sobre isso hoje, com um olhar maduro, terapêutico, eu diria que este, que foi o primeiro, continua a ser um grande sonho pra mim, que muito me traz felicidades. E para explicar isso, preciso delirar, sintonizar mais com a poeta do que com a arteterapeuta. Eu preciso dizer que nunca, jamais me adaptei ao meu mundo. Sempre estive nele sem estar nele, e assim tem sido por toda a minha vida. É nele em que a criança gira e a mulher procura entorpecentes suaves para a sua loucura circular.



Se as pessoas – pais e mães principalmente – compreendessem que os jovens buscam nas drogas a transcendência. Mesmo que não saibam, eles buscam um mundo cujo ritmo seja menos acelerado, onde a vibração não seja agressiva. Eu entendo que é preciso compreender que o mundo não está exatamente numa vibração acolhedora. Desapareceram as substâncias que já o fizeram mais leves. E os jovens sofrem. Seus egos desconhecem, mas suas almas sofrem da dor de um mundo sem magia, um mundo dominado pelo dinheiro, pelo capital. E essa é a maior brecha para a entrada da droga em suas vidas.



Eu girava. Eles começam, muito cedo, a fugir do mundo denso através das drogas. Muitos experimentam e esquecem. Outros permanecem. Há no mundo seres com graus de sensibilidade diferentes. Eu já sonhei que encontrava um povo cuja alma era vegetal e que se impregnaram de erupções contagiosas por não agüentarem a densidade do planeta terra. Eu também fui contagiada e, assim, deduzi que era um deles. Um sonho...

Um sonho que me levou a buscar coisas leves, belas, divinas em minha vida. Porque, se não as encontrasse, minha alma vegetal ficaria intoxicada. Uma semana após o sonho, a pele começou a ficar toda pipocada, de fato. Mesmo com a insistência de alguns, não recorri a um médico. Eu precisava apenas encontrar algum ponto, uma pequena dimensão, onde a vibração suave me curasse. E aí entra a arte, a arteterapia e tantas outras histórias.



E lembro primeiro do cuidador, os que, por vocação, curam-se cuidado do outro Minha história de vida sempre passou por isso. Depois vem o olhar sobre o mito, Abaluaê, o africano; Quíron, o grego, e tantos outros mitos que encarnam o arquétipo do curador ferido. Minhas cicatrizes dos giros não nada perto das outras, as internas. Mas meus giros deixando-me algumas cicatrizes me parece, de alguma forma, significativo. Para alcançar uma dimensão mais leve, mais sublime, era preciso abrir a carne. Sempre. Haveria outras formas de sair dessa dimensão densa quando a criança crescesse. E houve!



A música me faz girar. O teatro me faz girar. A poesia provoca giros acelerados. Mas até chegar a essa descoberta, experimentando muitas promessas de paraíso. E volto a falar dos jovens de alma vegetal, talvez, brincando um pouco com o sonho. Refiro-me aos dependentes de drogas. Todas elas, lícitas ou ilícitas. Do corpo e do sentimento. As ervas, as químicas, os traficantes, a dor dos pais, a morte, tantas vezes...



Os jovens que recuperam o seu poder de sonhar acordados, que voltam a sentir o ...enlevo...na vida real, não se tornam dependentes de drogas, ainda que as experimente eventualmente. O remédio é a embriaguez dos sentidos, é o encanto que brota dos chãos mais duros da terra. Os jovens já não sonham verdadeiramente. Já não acreditam no impossível. O que há é o pesadelo do sistema que cria insatisfações eternas, para vender felicidade embalada. A vibração desse mundo de guerras, de atrocidades, de destinos preestabelecidos pelo sistema, pelos pais, pelas escolas, ela desarmoniza a alma dos jovens e adolescentes. E eles, inconscientemente, buscam um paraíso.



Cuidemos de reencantar o mundo. De nos reencantarmos com ele. Voltemos a sonhar. Voltemos, principalmente nós, adultos, maduros, voltemos a ensinar encantos e felicidade aos nossos meninos. A apontar uma estrela, a levá-los a um observatório para ver a nossa pequenez e os mundos que um dia iremos conquistar. Mostremos a eles o arco-íris. Contemos histórias fantásticas, onde o impossível torna-se possível pela magia. Ensinemos a eles onde se guarda a magia: dentro de cada um. Nós nos desencantamos, ficamos prisioneiros do sistema, e contaminamos nossos jovens. Temos o dever de reencantá-los.  É absolutamente urgente que voltem a sonhar, que reaprendam a sonhar.



A proposta da oficina do Sonhar com as Mãos abre-se também para pais que estejam dispostos a começar por si mesmos o aprendizado do devaneio, do sonho, aqueles que sonhamos acordados. Ou que sonhávamos.



A primeira oficina trabalhará a persona, nossa máscara social, conforme as etapas em direção à individuação de Jung. Contudo, a máscara que trabalharemos inicialmente é a palavra. As palavras são máscaras poderosas e funcionam, tantas vezes, como cárceres. Não libertam, aprisionam. Revelam, mas tornam a velar. Sonharemos. Caminharemos pelo território da não-palavra. Viveremos uma ambiência de sonho. E a Arte estará sempre presente, a nos lembrar da maior de todas as artes: a Arte de sermos nós mesmos! Verdadeiramente. Porque só assim seremos felizes.



Na segunda oficina do Sonhar, dando prosseguimento à primeira, trabalharemos “a palavra encantada”. Um momento imperdível, que nasceu do fundo da alma, da alma da arte, da poesia. Mais esse é outro papo.


Mas antes de terminar, preciso voltar a falar das origens dos sonhos. Os seres, por exemplo, de alma vegetal, tem a origem de seus onde? E sua origem? E a do outro? Seriam a mesma? Sonhemos. Sem palavras gastas, rotas, puídas, corrompidas. Sonhemos com as mãos, mas nos aventuremos pelos caminhos dos outros sentidos.  


























Dia 5/10/2013
Horário: das 08 às 12
Investimento: R$ 160,00
Para os que se inscreverem até o dia 5 de setembro: R $120,00



As inscrições poderão ser feitas através do e-mail trcontreiras@gmail.com, com o envio do comprovante de depósito.

Ag: 1236 OP 013 Conta-poupança: 110635-8

Vagas limitadas. Reserve sua vaga por e-mail.



21 de ago. de 2013

Sonhar com as Mãos: um aventura arteterapêutica




"Capta essa coisa que me escapa"


Sonhar é um poema. Acredito que sim. Nessa perspectiva, todo sonhador é um poeta. Um poeta que, ao despertar, esquece as suas próprias metáforas, e quanto maias busca aproximar a luz do seu poema noturno, mais se distancia da compreensão de sua criação e de si mesmo. A luz do dia ofusca as imagens noturnas. As palavras, muitas vezes, distanciam os sonhos de sua essência, desvirtuando-lhe a linguagem. É como as pessoas que buscam entender a poesia utilizando a lógica da razão, impossibilitados de captar a dimensão do reino da não-palavra.

As palavras são véus. Sob eles, outros véus. A mesma máscara que nos desfigura o semblante encarcera linguagens infinitas, nas palavras-clichês, na linearidade que deforma nossos passos e distancia-nos do nosso Destino. E vem a lembrança de Clarice Lispector: “O que eu te falo nunca é o que eu te falo e sim outra coisa. Capta essa coisa que me escapa e no entanto vivo dela e estou à tona de brilhante escuridão”. A expressão de Clarice – “brilhante escuridão” – também nos faz recordar da dimensão onírica, noturna por natureza, e da substância da qual são feitos os sonhos. Mas, sim: é preciso captar essa coisa que nos escapa quando tentamos traduzi-la em palavras.

A primeira oficina “Sonhar com as mãos” é uma aventura pelo reino da não-palavra. O poeta Manoel de Barros já falou inúmeras vezes da necessidade de “restituir a virgindade das palavras”, porque, segundo ele, elas estão morrendo pelo uso dos clichês. Talvez esteja aí uma das razões de os sonhos parecerem tão enigmáticos, tão absurdos, sem sentido – os sonhos não são prisioneiros dos clichês. Não têm um relacionamento íntimo com o mundo desperto e nem podem ser subjugados pela literalidade. Sonhar é amplo, cósmico, mas também visceral e selvagem. “Não há de ser com a razão, mas com a inocência animal que se enfrenta um poema”, escreveu Manoel de Barros. Para compreender o sonho-poema é necessário que também cuidemos do animal ferido que há em nós. É preciso aprender a voz das coisas. Aventurar-se a desconstruir a palavra hirta. Encontrar-se a singularidade. Com a sensualidade das cores, que também ficaram aprisionadas pelos clichês. Nossa primeira aventura do “sonhar com as mãos” é o início de uma estrada que nos levará de volta a nossa casa, à nossa essência, à nossa singularidade. Sonhemos com as mãos!


Local, data e horário encontram-se no folder.

Incrições: abertas a partir de dia 1º de setembro

Investimento: R$ 160,00. Para os que se inscreverem até o dia 5 de setembro: 120,00

As inscrições poderão ser feitas através do e-mail trcontreiras@gmail.com, com o envio do comprovante de depósito.

Vagas limitadas. Reserve sua vaga por e-mail.


(Leiam as postagens anteriores, referentes ao trabalho que será desenvolvido)





A dor de homem, por mais que dilacere o peito, cria um jeito de ficar contida, às vezes até escondida, para não afrontar as normas, as regras.

Mas há a dor do bicho. A dor de bicho dilacera, urra, retumba, sangra as carnes desprevenidas. Sua voz se faz ecoar em lugares distantes. Atravessa florestas, às vezes, e se anuncia a distância.

Cuidamos muitas vezes das nossas dores humanas, esquecendo sempre há muitas feridas no nosso bicho. Bicho tantas vezes amordaçado, implodindo sua cólera oprimida. Bicho que não pode ser curado pelos caminhos “virtuosos” do homem. O bicho precisa expressar sua dor na sua linguagem.

Nós temos um bicho ferido. De nada adianta curar o homem se não curarmos o bicho. O bicho enfraquecido adoece o homem. Ele precisa chorar o seu urro, relinchar sua dor, retumbar a aflição que lhe toma o corpo e lhe possui pelas vísceras. As Dores Primais vão-se armazenando uma a uma em lâminas empilhadas de tensões que procuram libertar-se, mas isso só pode acontecer desde que haja ligações com suas origens. Que usemos a linguagem das dores primais.

A maioria de nós ainda não deu seu grito primal. A gente tem medo. Mas esse grito primal desobstrui os canais que nos impedem de fluir. A ferida do nosso animal ruge. Urra. E só assim a dor é liberada.

Curamo-nos de dentro para fora. E isso também se dá nas feridas mais primais do homem – a ferida do seu próprio animal interior.

Na nossa 1ª Oficina Sonhar com as Mãos, faremos contato com a ferida primal. Ali, no vermelho da ferida, encontram-se sementes das mais belas e perfumadas flores. Flores raras. Que brotarão sob uma orquestra onomatopéica animal. Serão as primeiras vozes da nossa casa do sonho, da nossa Aventura pelo Sonho. O corpo musical que erguerá nossos outros corpos.

Clarice Lispector, no Livro dos Prazeres, fala algo que nos interessa aqui, no contexto:

"Uma Experiência

E Lóri pensou que talvez essa fosse uma das experiências humanas e animais mais importantes. A de pedir socorro e, por pura bondade e compreensão do outro, o socorro é dado. Talvez valha a pena ter nascido para que um dia mudamente se implore e mudamente se receba. Eu já pedi socorro. E não me foi negado.

Senti-me então como se eu fosse um tigre perigoso com uma flecha cravada na carne, e que estivesse rondando devagar as pessoas medrosas para descobrir quem lhe tiraria a dor. E então uma pessoa tivesse sentido que um tigre ferido é apenas tão perigoso como uma criança. E aproximando-se da fera, sem medo de tocá-la, tivesse arrancado com cuidado a flecha fincada." Pág. 139.

A vivência da Arte dentro da Arterapia proporciona atingir dimensões mais longínquas das nossas dores. Na nossa primeira Oficina Sonhar com as Mãos, vamos buscar o animal ferido, deixando que ele libere a sua dor, e, então, poderemos, em seguida, entrar no Reino dos Sonhos. Sacralizando o sonhos, como faziam os antigos. Entrando em contato com as substâncias materiais que serviam de inspiração para nossos ancestrais. Criaremos com a intuição. Criaremos sonhando. Criaremos em sintonia com as primeiras criações dos homens. Com o barro do qual conta-se que foi feito o primeiro homem. As nossas mãos sonharão. Sem a intervenção mental: buscando serem guiadas apenas pela intuição. Nós nasceremos de nós mesmos. Deuses de si: um dia assim seremos todos!

A Oficina Sonhar com as Mãos é uma Aventura Arteterapêutica para os que não temem ir ao fundo de si mesmo, buscarem-se. E a Arte estará presente em, pelo menos, quatro modalidades diferentes.

Olhamos o mundo externo com nostalgia. Como afirmou o filósofo Bachelard, “antes de ser um espetáculo consciente, toda paisagem é uma experiência onírica”. O mundo que contemplamos hoje já foi sonhado um dia. Reaprendamos os caminhos do Sonho!















12 de ago. de 2013

Sonhar com as Mãos







Arte: Kalliope Amorphous



As mãos sonham. Este foi o primeiro insight que a Arteterapia me trouxe, quando ainda nem compreendia completamente os benefícios da nova abordagem terapêutica, sendo eu uma peregrina fatigada dos caminhos já um tanto enfadonhos das palavras. Não que a palavra em si não tenha o seu brilho, não se rompa em fagulhas que acabem por fazer arder a alma. A palavra é centelha que pode transformar noite em dia, angústia em êxtase. Pode trazer luz e revelar sombras ávidas por uma vida real. Mas não qualquer palavra, eis a verdade.

O filósofo Gaston Bachelard, em A Poética do Devaneio, chama a atenção para as palavras que perderam seu onirismo interno. E sugere uma pesquisa sobre os nomes que ainda sonham, os nomes “que são filhos da noite”. Quais seriam as palavras que ainda sonham, o verbo que delira, como teima em desejar o poeta mato-grossense Manoel de Barros? E o que tem a palavra a ver com o sonhar, com as mãos embriagadas de escuridão, enxergando apenas pela luz da intuição, vivenciando o devaneio diurno de que nos fala Bachelard?

A oficina Sonhar com as Mãos veio nascendo, pouco a pouco, desde o primeiro impacto provocado pela Arteterapia, e se desenvolvendo, enquanto projeto, a partir de reflexões de textos junguianos, pós-junguianos, da filosofia poética de Bachelard e das vivências da vida real, a escola da vida, que nos traz um saber indiscutivelmente precioso. A primeira oficina, que acontecerá no dia 5 de outubro, ainda não foca as palavras que sonham, não tem a finalidade de ir ao encontro das palavras noturnas, do verbo enlouquecido. Poderíamos dizer que ela é a primeira etapa de um processo que se desenrolará no seu ritmo próprio e tem como um dos objetivos trabalhar a não-palavra, a comunicação que se dá sem o verbo, a confiança de que é possível sonhar com as mãos.

Mais que uma oficina, o Sonhar com as Mãos é uma aventura. É uma proposta de devaneio diurno. Não conceituaremos os sonhos.  Não os definiremos. Ao contrário disso, vivenciaremos os sonhos, buscando, tanto quanto possível, nos aproximar da fronteira que divide esses dois universos: o diurno e o noturno. Entraremos no Reino da não-palavra. Nós nos colocaremos em estado de alma nascente. A imaginação é capaz de nos fazer criar o que ainda não foi concebido. E o “sem-nome” haverá de se impregnar de onirismo, que se recobrirá da palavra virgem, fruto da imaginação.

Mas sentiremos a dor do animal ferido, o animal esquecido no fundo do homem. O animal que precisa encontrar o seu som, a voz da sua dor, a carícia da mão humana sobre seu próprio ser esquecido, ferido, esperando a hora do grito e da canção. E com as mãos, criaremos aquilo que ainda não foi dito, que não pôde ser proferido, porque não cabia na linguagem dos homens.

Sonhar com as Mãos é uma aventura profunda em busca da imaginação criadora. O primeiro passo para o encontro com as palavras que sonham. A ambiência de sonho nos proporcionará o encontro com o território onde será possível conhecer os sonhos...sonhando! Sonhemos juntos!