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21 de ago. de 2013

Sonhar com as Mãos: um aventura arteterapêutica




"Capta essa coisa que me escapa"


Sonhar é um poema. Acredito que sim. Nessa perspectiva, todo sonhador é um poeta. Um poeta que, ao despertar, esquece as suas próprias metáforas, e quanto maias busca aproximar a luz do seu poema noturno, mais se distancia da compreensão de sua criação e de si mesmo. A luz do dia ofusca as imagens noturnas. As palavras, muitas vezes, distanciam os sonhos de sua essência, desvirtuando-lhe a linguagem. É como as pessoas que buscam entender a poesia utilizando a lógica da razão, impossibilitados de captar a dimensão do reino da não-palavra.

As palavras são véus. Sob eles, outros véus. A mesma máscara que nos desfigura o semblante encarcera linguagens infinitas, nas palavras-clichês, na linearidade que deforma nossos passos e distancia-nos do nosso Destino. E vem a lembrança de Clarice Lispector: “O que eu te falo nunca é o que eu te falo e sim outra coisa. Capta essa coisa que me escapa e no entanto vivo dela e estou à tona de brilhante escuridão”. A expressão de Clarice – “brilhante escuridão” – também nos faz recordar da dimensão onírica, noturna por natureza, e da substância da qual são feitos os sonhos. Mas, sim: é preciso captar essa coisa que nos escapa quando tentamos traduzi-la em palavras.

A primeira oficina “Sonhar com as mãos” é uma aventura pelo reino da não-palavra. O poeta Manoel de Barros já falou inúmeras vezes da necessidade de “restituir a virgindade das palavras”, porque, segundo ele, elas estão morrendo pelo uso dos clichês. Talvez esteja aí uma das razões de os sonhos parecerem tão enigmáticos, tão absurdos, sem sentido – os sonhos não são prisioneiros dos clichês. Não têm um relacionamento íntimo com o mundo desperto e nem podem ser subjugados pela literalidade. Sonhar é amplo, cósmico, mas também visceral e selvagem. “Não há de ser com a razão, mas com a inocência animal que se enfrenta um poema”, escreveu Manoel de Barros. Para compreender o sonho-poema é necessário que também cuidemos do animal ferido que há em nós. É preciso aprender a voz das coisas. Aventurar-se a desconstruir a palavra hirta. Encontrar-se a singularidade. Com a sensualidade das cores, que também ficaram aprisionadas pelos clichês. Nossa primeira aventura do “sonhar com as mãos” é o início de uma estrada que nos levará de volta a nossa casa, à nossa essência, à nossa singularidade. Sonhemos com as mãos!


Local, data e horário encontram-se no folder.

Incrições: abertas a partir de dia 1º de setembro

Investimento: R$ 160,00. Para os que se inscreverem até o dia 5 de setembro: 120,00

As inscrições poderão ser feitas através do e-mail trcontreiras@gmail.com, com o envio do comprovante de depósito.

Vagas limitadas. Reserve sua vaga por e-mail.


(Leiam as postagens anteriores, referentes ao trabalho que será desenvolvido)





A dor de homem, por mais que dilacere o peito, cria um jeito de ficar contida, às vezes até escondida, para não afrontar as normas, as regras.

Mas há a dor do bicho. A dor de bicho dilacera, urra, retumba, sangra as carnes desprevenidas. Sua voz se faz ecoar em lugares distantes. Atravessa florestas, às vezes, e se anuncia a distância.

Cuidamos muitas vezes das nossas dores humanas, esquecendo sempre há muitas feridas no nosso bicho. Bicho tantas vezes amordaçado, implodindo sua cólera oprimida. Bicho que não pode ser curado pelos caminhos “virtuosos” do homem. O bicho precisa expressar sua dor na sua linguagem.

Nós temos um bicho ferido. De nada adianta curar o homem se não curarmos o bicho. O bicho enfraquecido adoece o homem. Ele precisa chorar o seu urro, relinchar sua dor, retumbar a aflição que lhe toma o corpo e lhe possui pelas vísceras. As Dores Primais vão-se armazenando uma a uma em lâminas empilhadas de tensões que procuram libertar-se, mas isso só pode acontecer desde que haja ligações com suas origens. Que usemos a linguagem das dores primais.

A maioria de nós ainda não deu seu grito primal. A gente tem medo. Mas esse grito primal desobstrui os canais que nos impedem de fluir. A ferida do nosso animal ruge. Urra. E só assim a dor é liberada.

Curamo-nos de dentro para fora. E isso também se dá nas feridas mais primais do homem – a ferida do seu próprio animal interior.

Na nossa 1ª Oficina Sonhar com as Mãos, faremos contato com a ferida primal. Ali, no vermelho da ferida, encontram-se sementes das mais belas e perfumadas flores. Flores raras. Que brotarão sob uma orquestra onomatopéica animal. Serão as primeiras vozes da nossa casa do sonho, da nossa Aventura pelo Sonho. O corpo musical que erguerá nossos outros corpos.

Clarice Lispector, no Livro dos Prazeres, fala algo que nos interessa aqui, no contexto:

"Uma Experiência

E Lóri pensou que talvez essa fosse uma das experiências humanas e animais mais importantes. A de pedir socorro e, por pura bondade e compreensão do outro, o socorro é dado. Talvez valha a pena ter nascido para que um dia mudamente se implore e mudamente se receba. Eu já pedi socorro. E não me foi negado.

Senti-me então como se eu fosse um tigre perigoso com uma flecha cravada na carne, e que estivesse rondando devagar as pessoas medrosas para descobrir quem lhe tiraria a dor. E então uma pessoa tivesse sentido que um tigre ferido é apenas tão perigoso como uma criança. E aproximando-se da fera, sem medo de tocá-la, tivesse arrancado com cuidado a flecha fincada." Pág. 139.

A vivência da Arte dentro da Arterapia proporciona atingir dimensões mais longínquas das nossas dores. Na nossa primeira Oficina Sonhar com as Mãos, vamos buscar o animal ferido, deixando que ele libere a sua dor, e, então, poderemos, em seguida, entrar no Reino dos Sonhos. Sacralizando o sonhos, como faziam os antigos. Entrando em contato com as substâncias materiais que serviam de inspiração para nossos ancestrais. Criaremos com a intuição. Criaremos sonhando. Criaremos em sintonia com as primeiras criações dos homens. Com o barro do qual conta-se que foi feito o primeiro homem. As nossas mãos sonharão. Sem a intervenção mental: buscando serem guiadas apenas pela intuição. Nós nasceremos de nós mesmos. Deuses de si: um dia assim seremos todos!

A Oficina Sonhar com as Mãos é uma Aventura Arteterapêutica para os que não temem ir ao fundo de si mesmo, buscarem-se. E a Arte estará presente em, pelo menos, quatro modalidades diferentes.

Olhamos o mundo externo com nostalgia. Como afirmou o filósofo Bachelard, “antes de ser um espetáculo consciente, toda paisagem é uma experiência onírica”. O mundo que contemplamos hoje já foi sonhado um dia. Reaprendamos os caminhos do Sonho!















Um comentário:

  1. Muito interessante, Tânia! Ah se eu pudesse participar, tenho certeza que iria gostar muito,
    pois a fera que existe cá dentro está cada dia mais indócil :)

    beijoss

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