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16 de mai. de 2013

Arteterapia e TDAH: medicamentos ou arte?







Leio, inúmeras vezes – assim como ouço – que o tal “Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) é neurobiológico, de causas genéricas, que aparece na infância. Eu não acredito nisso. Não há quem me convença que, de repente, vivamos uma era onde tantas crianças e adolescentes sofram de males que no passado nem se ouvia falar. Também acho, no mínimo, sintomático, que todas as associações que defendem a existência desses distúrbios sejam mantidas por laboratórios farmacêuticos. Pergunto-me se a existência dessa relação, com o interesse de vender remédios, pode ser confiável, e se esses pretensos diagnósticos estão sendo feitos, de fato, para melhorar as crianças e adolescentes.

Uma fala constante dos especialistas da área psicopedagógica, quando os pais, em desespero, procuram os profissionais para descobrir a causa do baixo rendimento escolar de seus filhos e o desinteresse pelas atividades escolares: “O problema está no sistema; mas como não podemos mudar o sistema, trabalhamos para adaptar o aluno a ele”. Essa expressão que menciona a “adaptação” não passaria de um eufemismo? Adaptar o aluno ao sistema não seria o mesmo que mutilá-lo, aniquilar sua espontaneidade expressiva, sua capacidade criativa, sua sin-gu-la-ri-da-de? Não sei...

É fato que a qualidade de ensino no Brasil é péssima. Fato também que a educação veicula, inconscientemente, por parte dos simples professores, a ideologia do capitalismo, que trabalha na direção da padronização. Pressupõe que todos os indivíduos são iguais, ou que devam ser iguais. E aqueles que fogem dos padrões são imediatamente rotulados, passam a ter que viver com o estigma de um transtorno inventado, na maioria dos casos.

E a grande vedete do momento para esses males fabricados por conveniências diversas, e que tem por trás a indústria medicamentosa, é a Ritalina, medicamento cujos efeitos têm sido comparados, por especialistas, como o da cocaína. Eu fico me perguntando se é justo que peguemos uma criança que não tem interesse pelo ensino, num modelo ultrapassado ou voltado apenas para a questão do vestibular, que não tenha uma educação que inclua a ludicidade e que não considere as singularidades de cada um, tenha que tomar a tal da Ritalina, com efeitos, segundo alguns especialistas, parecidos com o da cocaína. Sem dúvida, o medicamento o deixará funcional (às vezes robotizado), mas certamente não despertará um interesse real pelo que está estudando e continuará a perceber que a pedagogia e os interesses curriculares não o alcançam, não encontram pontos de ressonância dentro deles.

Nem vou falar de relatos de mães que declaram que seus filhos, depois da utilização da Ritalina, perderam o ânimo para brincar, jogar, criar. Vou falar do sistema simbólico e imaginário de cada aluno que é único e que não podemos generalizar as situações. Falarei que, se o erro está no sistema, não podemos achar que um medicamento que promove tantos males seja a solução dos problemas, porque na verdade o desespero e a falta de criticidade de pais e educadores têm evitado uma reflexão mais séria sobre o assunto.

Acontece que reduziram a dimensão humana a uma dimensão orgânica e biológica, e somos muito mais que isso: temos cultura, sociedade, psiquismo, ou seja, várias dimensões que constituem a humanidade. A volta das explicações organicistas, somada ao desenvolvimento de medicamentos na área da psiquiatria e à ideia de que as pessoas que não conseguem fazer determinadas coisas possuem algum tipo de transtorno, chegou à educação. Não é concebível imaginar que uma criança que vai tomar Ritalina porque tem dificuldade de atenção na escola vai conseguir se interessar pelo que não se interessava antes. Isso é um absurdo.

Uma criança considerada hiperativa está a reclamar mais movimento, mais agilidade, está mostrando que o seu ritmo não condiz com o ritmo da escola, da aprendizagem. Ela solicita, com todo direito, mais. Da mesma forma, uma criança que é diagnosticada como tendo Déficit de Atenção está passando a mensagem de que aquilo que estão dizendo não a interessa, não está sendo passado de forma interessante, e, que, portanto, não há déficit nenhum, apenas um desinteresse plenamente justificado.

Subliminarmente, estamos passando para as crianças a mensagem de que o mundo está todo em ordem, o sistema é perfeito, mas elas (as crianças) é que têm problemas. Além da deslavada mentira que estamos, de alguma forma, passando para as crianças, a possibilidade de baixa auto-estima passa a ser grande. Consciente ou inconscientemente, estamos gravando nas crianças a incapacidade de enfrentar desafios sozinhas, estamos abolindo a ludicidade na vida de crianças e adolescentes, ao cobrarmos, indiretamente, que elas respondam às expectativas do sistema, mesmo que para isso elas tenham mutilado o seu verdadeiro potencial criativo. E não creio que nenhum pai ou mãe desejem que seus filhos, futuramente, tenham um diploma, mas já não saibam de si próprios, já não saibam ser críticos, inovadores, revolucionários. E é isso que acontecerá se não pararmos para dar a este tema a atenção devida.

É quase um crime uma criança crescer acreditando que é uma droga que irá ajudá-la a viver, a se relacionar, a responder aos desafios da vida. E como um remédio que tem anfetamina, ou seja, que tem a mesma origem que a cocaína, com efeitos colaterais gravíssimos, pode ser algo que ajude essa criança a melhorar sua vida?

Estudos em todo o mundo comprovam que a Ritalina funciona no cérebro igualzinho à cocaína. E agora? Quem é mesmo seu filho? Quais são as reais potencialidades dele que não são e não serão desenvolvidas através de medicamentos? E onde entra a Arteterapia nisso tudo?

Eu acredito que a Arteterapia pode, nesse momento de confusão para pais e educadores – que respondem submissamente ao sistema – ajudar a desenvolver os potenciais criativos dessas crianças e adolescentes estigmatizadas por fugirem ao padrão exigido pelo sistema. A Arteterapia é uma abordagem que, essencialmente, singulariza cada ser. Para a Arteterapia não deverá haver “hiperativos” ou pessoas com “déficit de atenção”. Haverá sim, pessoas que imprimirão seu próprio ritmo, pessoas que focarão naquilo que lhes é interessante, que contribua para suas autodescobertas, para o desenvolvimento de suas potencialidades. A Arte em si já liberta dos estigmas aqueles que a sociedade rotula por incompetência de olhar com a singularidade devida. Além disso, a abordagem arteterapêutica ajuda a recuperar a dimensão criadora do ser, com todas as suas peculiaridades, diferenças, cores, tons, sons.

Alunos que vão mal em Redação – por mais que decorem a estrutura, por mais que tenham aulas extras – , de repente descobrem que a educação que tiveram amputou sua veia criativa, trancafiou em algum lugar sua imaginação. E, ao recuperarem, sentem-se aptos a escrever, criar, criticar e reivindicar o seu direito de serem diferentes. Porque é pela diferença que sofrem. É pelos caminhos singulares de aprendizado que são rotulados, robotizados e medicados. É inadmissível que a Arte esteja sendo tratada nas escolas como a matemática, exigindo dos alunos que a criação corresponda às expectativas dos professores, sem que a expressividade do aluno seja considerada. Por vivência, por experiência própria, eu recomendaria a Arteterapia a todos os pais e alunos que vivenciam esse conflito que se constitui em ver o filho atendendo às expectativas do sistema ou ver-lhes felizes por ter se libertado de uma educação que é filha de um sistema padronizador e assassino. Um sistema que mutila.

Se cabe aos pedagogos ajustar o aluno ao sistema, de uma forma mais suave, aos Arteterapeutas cabe o papel de libertá-los, libertar sua dimensão simbólica única, sua singularidade.

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2 comentários:

  1. Concordo plenamente, Tânia.
    Alguns psicopedagogos indicam a Arteterapia como auxiliar no tratamento dos diagnosticados com TDAH e dislexia.
    É visível e rápida a mudança que ocorre nessas crianças quando atendo usando a Arteterapia...
    São crianças muito mais inteligentes e sábias que nós, seus professores e familiares.
    Uma nova forma de educar precisa surgir, com urgência!
    Abraços,
    Celeste Carneiro

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  2. Novos olhares para educação é necessário, Nossas crianças e adolescentes estão com fome de espaço apara crescer e a arteterapia sem dúvida nutri todos que dela se alimentam e desenvolvem-se em plenitude. Heloisa Pacheco

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