Arte: Diane Shenandoah
“Quero saber para
melhor sentir e sentir para melhor saber.”
(Paul Cézanne)
Sempre há alguém perguntando o
que é, mesmo, Arteterapia. Sempre, o equívoco de que a expressão artística por
si só seja a mola propulsora da Arteterapia. Não, não é. Se assim fosse,
bastaria criar. Criar é muito e transforma. Mas a Arte, na Arteterapia, é
mediadora. Através dela, podemos nos relacionar com o universo íntimo,
singular, de cada paciente. Há quem prefira falar “cliente” – eu não gosto. Mas
também não me sinto confortável em utilizar a expressão “paciente”. Mas, em falta
de um nome ideal, chamemos de “paciente” aquele que se submete à terapia que
tem a Arte mediando, fazendo a ponte entre o mundo consciente e a dimensão
inconsciente da psique. Pois então: a Arte é mediadora. É importante
conhecermos diversas modalidades artísticas; e, na formação, experimentamos
muitas delas. Outra dúvida que sempre surge é quanto à necessidade de o arteterapeuta
ser um artista, ter uma formação anterior ligada às artes. Não, não é preciso.
Se assim fosse, todo artista, toda pessoa formada em Artes seria um bom
arteterapeuta. A Arteterapia une Arte e Psicologia. E essa é uma união que não
pode se dar de forma artificial e forçada.
A Arteterapia precisa de uma base
teórica. A relação do paciente com sua criação se dá de forma espontânea,
através de sua observação, sua percepção, seus sentimentos e insights. O arteterapeuta precisa de uma
ou mais linhas de pensamento teórico que o conduza. Por isso existem várias
abordagens na Arteterapia: Arteterapia com abordagem junguiana; Arteterapia gestáltica;
Arteterapia transpessoal, e por aí vai. Cabe ressaltar, desse modo, que é
imprescindível que uma ou mais correntes psicológicas sejam condutoras nessa
modalidade terapêutica. Não cabem invencionices, como estamos vendo acontecer a
todo instante, chegando ao absurdo de existirem pessoas autodenominando-se “arteterapeutas”
e anunciando atendimento a distância, sugerindo que se envie desenhos,
pinturas, enfim, algo que em nada condiz com a Arteterapia séria, que não prescinde da observação de todo o processo criativo, e não apenas o resultado final, sem falar em
todos os estágios necessários para o conhecimento do paciente e a criação de
vínculos.
O arteterapeuta, como todo
profissional que atua nas áreas psicoterapêuticas, precisa estudar
constantemente e conhecer os novos caminhos apontados pela Psicologia. Se assim
não for, estarão estagnados, apenas repetindo fórmulas e desvirtuando a
essência de um trabalho que necessita, sempre, de Alma. O conhecimento da
História das Arte e de todos os movimentos artísticos ao longo dos tempos é
bem-vindo, porém não é essencial. Pouco importa se a criação do paciente tende
para esse ou aquele estilo; o que conta, de fato, é a forma como podemos “escutar”
o que ele – o paciente – diz através de sua elaboração artística, através de
seu processo de criar, através de sua fala, seu olhar, suas emoções. Não
raramente, um arteterapeuta é solicitado por algum conhecido ou amigo a “interpretar”
o desenho de um filho, uma pintura, uma criação artística. Isso não existe,
precisamos informar. Primeiro, porque – acredito eu – não é trabalho de um arteterapeuta
“interpretar” nada. Cabe ao profissional acompanhar cada passo no fazer
artístico, cada expressão do paciente, dificuldades, observações, associações,
e intervir, com base também nos conhecimentos teóricos, mas sobretudo com
Alma, intuição, ajudando o paciente a revelar-se a si mesmo, tendo a Arte como
mediadora. Embora aprendamos técnicas diversas, não podemos ignorar que cada
paciente é um universo, cada momento solicita de nós percepção, flexibilidade,
intuição para alcançarmos mais um degrau em direção à dimensão desconhecida
daqueles que nos procuram.
Na abertura do meu trabalho
arteterapêutico, costumo utilizar a Poesia sempre – uma modalidade artística
ainda pouco explorada na Arteterapia –, como uma forma de sensibilização para a
entrada numa dimensão metafórica. A partir daí, seguimos com reflexões do
paciente, fazendo ponte entre o que leu e sentiu e o seu mundo, seus
sentimentos, suas vivências. Num momento posterior, trabalhamos uma modalidade
artística que amplie as questões emergentes e caminhamos no sentido de elaborações
e revelações através da criação. Os resultados são surpreendentes e, ao longo
das sessões, não raro os próprios pacientes encontram pontos de interseção
entre trabalhos realizados anteriormente.
O importante é que deixemos claro
que Arteterapia não é simplesmente “fazer arte”. Tampouco é “interpretar”
desenhos, esculturas, pinturas etc. A linguagem artística em muito se assemelha
aos sonhos. Temos diante de nós algo que fala por si só, trabalhos cujo
entendimento passa pelo “sentir”. Sim, é preciso que o Arteterapeuta beba em
várias fontes. É preciso “saber”. Mas, saber para “sentir”. Paul Cézanne,
considerado o fundador da arte moderna, registrou: “Quero saber para melhor
sentir e sentir para melhor saber.” Eu diria: Quero saber para melhor sentir e
sentir para melhor saber, e saber para melhor sentir...numa relação incessante entre a
mente e o coração que possa, o tempo todo, vivificar a Alma.